domingo, 28 de outubro de 2018

Participação na Palestra "Análise Comparativa entre a Jurisprudência de Direito Ambiental da França e do Brasil"


Dia 25 de outubro ocorreu a Palestra "Análise comparativa entre a Jurisprudência de Direito Ambiental da França e do Brasil", onde participamos como ouvinte, com significativo aprendizado do direito ambiental francês. Ao mesmo tempo, o Desembargador Ricardo Cintra Torres de Carvalho, Coordenador da área de Direito Ambiental da Escola Paulista da Magistratura fez um exposição muito apropriada sobre a situação dos principais problemas fáticos e processuais enfrentados pelo Direito Ambiental brasileiro. Pelo lado francês falaram os magistrados Doutor Christian Pers e Doutor Denis Jardel. 

Esse último fez uma abordagem sobre o direito ambiental civil, destacando especialmente a gênese da responsabilidade civil por acidentes ambientais na França. Nesse contexto, explicitou o papel que o acidente com o petroleiro Erika, ocorrido em 1999 na costa francesa, exerceu para conformar a jurisprudência do Direito Ambiental na França, contribuindo para desenvolver uma tipo de responsabilidade mais adequada para tais eventos. O caso Erika revelou a fraqueza da configuração da responsabilidade internacional pois limitava a indenização, ficando de fora as comunidades. Lembrou que o transporte de óleo não é dejeto ou lixo, para que se utilizasse a Convenção internacional que dispunha dessa responsabilidade mais rigorosa.  Salientou igualmente que a Carta do Meio Ambiente, de 2005, que inseriu o meio ambiente dentro da Constituição francesa, tornou-se um ponto fundamental para consolidação de uma posterior codificação da legislação com o surgimento do Código Ambiental de 2016. Enfatizou que o Código Ambiental não encerra todas as leis que tem repercussão no plano do meio ambiente, havendo outras leis que são úteis para disciplinar a matéria, como o próprio Código Civil, que ao inserir os novos artigos, que vão 1246 ao 1249, definem o denominado "dano ecológico puro". A introdução do dano ecológico no Código Civil tem como uma das suas características que a parte tem como obrigação principal a reconstituição "in natura" do dano, e não sendo possível, sua compensação pecuniária. Mencionou igualmente que mesmo sem aplicar a responsabilidade objetiva, utilizando apenas da responsabilidade clássica, pode-se realizar uma adequada reparação da dano ambiental. Lembra igualmente que no ordenamento jurídico francês o último possuidor deve responder pela descontaminação de área afetada, pelo menos ao status quo das condições para as atividades que já estavam sendo desenvolvidas anteriormente. Assim, o comprador pode obrigar que o último possuidor a despoluir o terreno, não se aplicando no caso a teoria do risco integral. Mencionou que na França a autorização para a instalação e funcionamento de atividades de grande risco é unicamente autorizada pelo legislativo, enquanto que as de riscos médio e pequeno são autorizadas pelas prefeituras.  Finalizou sua fala chamando a atenção para a introdução da Teoria do Risco Anormal de Vizinhança, apresentado no artigo 1246 do Código Civil, fruto da construção jurisprudencial,  que consiste na ideia de que a vida em sociedade exige suportar transtornos , mas alguns transtornos exigem reparação, se perguntando se esse seria o tipo de responsabilidade que se desenvolveria nos próximos anos. 

Segundo o magistrado Christian Pers, que fez uma abordagem a partir da perspectiva do direito penal ambiental, a jurisdição penal francesa tem como característica a competência para se pronunciar sobre um ato administrativo afastando esse ato, ou suspendendo sua eficácia, ainda que, segundo ele, somente a jurisdição administrativa poderá invalidá-lo. Reconhece que para a evolução do direito ambiental francês a Carta do Meio Ambiente, que passou a integrar o bloco de constitucionalidade tem a capacidade de fazer frente aquilo que ele denominou de "terrorismo ecológico". Como ponto importante para a evolução do direito ambiental francês, apontou a Diretiva da União Europeia de 19 de novembro de 2008 que enfatiza o papel da legislação penal e das sanções criminais para o reforço da legislação ambiental, combatendo, inclusive as condutas que favoreçam os "paraísos ambientais" ( que seriam o deslocamentos das atividades degradadoras para territórios com baixa exigência ambiental). Assinala como positiva a transposição da legislação internacional para o direito doméstico francês. Destaca alguns conceitos importante, tais como a pluralidade de causas na determinação de danos ambientais, com a evolução da causa direta e imediata para causas prováveis, a mudança do risco de expor a pessoa, ainda que esse risco se manifestasse mais tarde. Destacou que as atividades lesivas ao meio ambiente, ainda que contasse com a tolerância administrativa, essa não faz desaparecer a infração. Tal como seu colega, mencionou o impacto que a construção jurisprudencial do dano ecológico puro teve  sobre o legislador que deu definição legal para tal tipo, o que, segundo ele, configura um direito penal ambiental inventivo e criador. Retomando o caso Erika, apontou que as convenções sobre a matéria restringiam a compensação a indenização tarifária, o que exigiu uma modificação frente a complexidade que o acidente avocou tendo em vista a insuficiência dessa indenização para cobrir os danos que eram muitos maiores. Isso forçou, não somente a mudança desse tento tarifário, mas também permitiu a construção do conceito de dano ecológico puro, levando inclusive mudanças quanto aos titulares, ou partes, no polo ativo das ações, ou das partes juridicamente interessadas. Nesse plano, se introduz a legitimidade de associações que podiam reivindicar não somente danos diretos, como também danos indiretos. Por fim, pontuou a formação de eco-máfias que traficam recursos e espécies protegidas.  

Como última parte da palestra, fez a exposição do direito ambiental brasileiro o Desembargador Ricardo Cintra Torres de Carvalho que assinalou entre os desafios mais sérios a questão urbana, as ocupações irregulares, o conflito da lei no tempo, a busca de uma forma razoável de valoração do dano ambiental, especialmente em dinheiro. Igualmente, apontou como dificuldade a demora do julgamento e execução das sentenças.  Mencionou ainda os problemas dos aterros e lixões, a descontaminação de áreas, como ocorreu no caso de um área de moradia onde 57 prédios foram construídos sobre solos contaminados por metano, e cuja propositura da ação se deu em 2001, a sentença foi apenas prolatada em 2012, exigindo da empresa ré o pagamento de 50 milhões de reais de indenização, o que levaria a quebra da própria empresa. Um último problema mencionado diz respeito a ocupação de área pública. 


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